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sexta-feira, 24 de março de 2023

No café da manhã

Eu provei das lágrimas mais amargas,

Distintamente saborosas, adoçadas de tristeza, apenas.

Mão esquerda agarrada ao peito pisado,

Por entre os dedos, o pijama amarrotado e úmido, testemunho de uma noite atormentada.

Cotovelo sobre a mesa fria, buscando um reconforto qualquer,

Enquanto a mão direita, compadecida, tenra, me afagava o rosto...

Assim -- cansado -- amassado por um sono irrequieto de uns abraços descuidados do lençol.

Foram daí que essas minhas lágrimas, pesadas, carregadas de amargura, fluiram, autônomas,

Silenciosas, liberadoras, discretas,

Percorrendo cautelosas por meus dedos, tal qual ecos de um coração partido, até o momento da queda livre, rumo ao escuro

E amargo café, estagnado em sua xícara, na manhã de hoje.


Rodrigo Aleixo
(adaptado da versão de 6 de dezembro de 2018)

quarta-feira, 1 de junho de 2022

Depois de ontem, antes de amanhã

Sabe quando as pessoas dizem que gostariam de voltar no tempo para aconselharem-se a si mesmas?
Pois eu bem queria que fosse ao contrário.
Quisera eu receber um enorme abraço apertado meu, de 30 anos atrás, que me permitisse reaprender a confiar nos meus próprios instintos.
E o quão bom seria se, há 25 anos, meu eu de 10 anos me fizesse herdar tão bela compaixão, que era inerente a mim, por todos os seres vivos?
E quem dera poder pedir a mim mesmo, aos meus 15 anos de idade, que me ensinasse a sorrir por tudo e por nada, à tudo e a todos, e que não me deixasse perder de vista a minha inocência tardia... 
Oxalá eu pudesse aprender com o meu eu de 20 anos o verdadeiro sentido que tem o amor incondicional.
Seria uma honra sentar-me comigo mesmo de há dez anos e agradecer por todas as decisões, conscientes ou inconscientes, que me atraíram e conduziram ao caminho pelo qual agora enveredo.
Me daria muito gosto poder me parabenizar cinco anos atrás por chegar, ainda que cambaleante, aos 30 e pedir a mim mesmo que me mostrasse como manter a firmeza e orientação inabaláveis que eu já parecia possuir neste infindável caminho rumo à paciência.
Da mesma forma esperava encontrar-me comigo mesmo há cinco meses para que me mostrasse como sonhar acordado, não obstante toda a dor e tristeza do mundo real.
Isso põe fim às minhas divagações, uma vez que tudo aqui não tem qualquer relevância concreta. Em meu íntimo, todos estes seres me estão ainda ao alcance. Diante do meu nariz. 
Trata-se pois de um memorando. Tudo o que se faz necessário é um tantinho mais de esforço e bravura pra vasculhar em meu passado aquilo que me parece faltar para hoje.
E amanhã, assim que abrir os meus olhos, poderei ter total confiança na minha pessoa de hoje para que me prometa, com toda sinceridade do mundo, que o melhor de mim estará sempre em mim mesmo.

Rodrigo Aleixo